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As mudanças na educação por conta da crise gerada pelo Coronavírus



No Fluxxo Entrevista desta semana, conversamos com o Diretor do Colégio e Curso Intellectus, Gustavo Fernandes, para entender como um dos setores mais afetados pela pandemia - a educação, teve que se reinventar, em tempo recorde, para atender à necessidade de milhares de alunos.


Separamos as principais dúvidas relacionadas às mudanças na educação por conta da crise gerada pelo COVID-19. Confira como foi a entrevista:


Gustavo, você é diretor de um colégio muito tradicional no Rio de Janeiro, que tem mais de 20 anos de história e que já formou milhares de alunos ao longo desses anos. De uma hora pra outra, chegou a pandemia e mudou tudo na rotina de vocês. Como foi lidar com essa mudança repentina?


"Assim que a gente soube do cancelamento das aulas, nossa via inicial foi a questão da ausência de uma definição em curto prazo. No dia 13 de março, fomos notificados de que deveríamos fechar as escolas pelo Governador Witzel e, logo em seguida, marcamos uma reunião, na segunda-feira, dia 17, para fazer um planejamento e não sabíamos para quanto tempo tínhamos que fazê-lo. Essa foi a principal dificuldade inicial. Tínhamos algumas vantagens no início, pois já tínhamos algum preparo para esse ambiente, já tínhamos usado a plataforma numa disciplina específica e estávamos implementando um projeto com tecnologia para as aulas.Tivemos, inclusive,uma reunião com os professores e vimos que era fundamental ter a internet como aliada na educação e não como adversária. Esse início foi muito corrido e intenso. Eu sou um cara que nunca começa a semana sem um planejamento e eu estava com dificuldade de fazer um planejamento diário. Por um lado, havia uma coisa boa, que era a Instituição toda parada, a dispor de montar um ensino a distância e um ensino não-presencial. E eu tinha quase 30 lideranças pedagógicas aptas a desenvolver isso. Mas para a escola,que é uma das empresas que mais trabalham com planejamento, a gente consegue montar um para daqui a 2, 3 anos. Da noite para o dia.Então, fazer algo sem planejamento algum teve um impacto muito grande."


A primeira semana de paralisação deve ter sido uma loucura. Como foram os bastidores dessa gestão inicial da crise?


"O primeiro comunicado foi a antecipação de recesso. O maior problema era não ter um primeiro comunicado do tipo “Vocês vão ficar cinco meses parados”. Até hoje, temos dificuldade de lidar com essa situação. Muitas pessoas ficam negando ou ampliando o tempo durante o qual vai ficar parado. A falta desse corte de tempo foi o que mais angustiou.Fizemos uma reunião logo na segunda-feira para definir alguma resposta rápida para os alunos que vão prestar vestibular. Com isso, definimos as videoaulas para a semana seguinte. Então, o Terceiro Ano e o Pré-Vestibular não seguiram o recesso de quinze dias, ficaram só uma semana. Na semana seguinte, colocamos videoaulas para eles. Na volta desse recesso, eles entraram em um modelo no qual toda a Escola ficou. Ainda na primeira semana, na quarta-feira, a gente se reuniu novamente para definir como faríamos para a Escola inteira."

Como foi essa adaptação do colégio a transformá-lo em digital?


"A partir disso que falei, criamos o projeto Fase A, em que fomos implementando ferramentas aos poucos dentro da plataforma para que o aluno e o responsável pudessem se acostumar com aquilo e, mais ainda, para que a Instituição pudesse se acostumar com aquilo. É impressionante como todo mundo teve que aprender. Todo mundo teve dificuldade de compreensão. Na verdade, você vai desenvolvendo algo completamente novo, como eu disse, sem planejamento algum. Então muitas vezes você define que algo vai ser feito na semana seguinte e aquilo não funciona, de maneira que você tem que replanejar. Fizemos essas duas reuniões na primeira semana, uma segunda e outra na quarta-feira. E na quinta e na sexta-feira, começaram as gravações no estúdio e acabamos gravando videoaula numa produção que envolveu mais ou menos 300 a 400 vídeos semanais."


Além dos desafios cognitivos, há também os desafios psicológicos como tédio, estresse, ansiedade, entre outras coisas que influenciam o comportamento. Acha que os colégios estão preparados para lidar com isso, tanto agora quanto após a pandemia?


"Os colégios sempre estiveram preparados para lidar com isso.De certa forma, sempre fomos um porto seguro para as questões emocionais. Nós não somos os mais qualificados para lidar com o estresse ou com a depressão, pois existem profissionais que estudam para isso, com qualificação e certificação. Mas tirando os casos em que você tem uma recomendação médica, em geral, nós sempre fomos um porto seguro para as famílias. Não só o Intellectus como todas as outras escolas. A questão é que agora temos um desafio ainda maior. A falta de planejamento prévio foi para todas as empresas, mas para as pessoas físicas também. Então ninguém se planejou mentalmente para isso. Se você já tinha um relacionamento conturbado na sua casa, agora, isolado, esse relacionamento fica ainda mais conturbado. Se você tem déficit na relação pais e filhos, ele fica mais agravado numa situação como essa. Então, o desafio é ainda maior. As escolas não estavam preparadas para lidar com essas emoções à distância. Não tem como trazer ninguém nem ir para casa da pessoa dar um ombro amigo. Então as escolas ainda estão vivendo a adaptação de seus alunos e responsáveis dentro de um modelo nunca praticado. Chegar a um equilíbrio emocional é muito difícil. Hoje mesmo vou começar a dar aula de Inteligência Emocional para os alunos de Terceiro Ano e Pré-Vestibular. Muitas escolas têm o socioemocional nas suas grades. Acredito que as escolas que já o tinham em suas grades acabam tendo uma vantagem numa hora como essa, desde não o tenham retirado da grade neste momento."


A convivência familiar sofreu impacto por conta desta crise. O que você acha que deve ser feito para evitar desgaste e distanciamento na relação entre pais e filhos?


"Com o isolamento, a Escola tem que estar muito suscetível aos problemas, a ouvir os pais e os alunos e ter um canal aberto entres eles, como já existia, só que agora à distância. E tem que elevar demais o nível de compreensão. As pessoas estão mais agressivas e estressadas e ficam sem uma definição do que vai acontecer com a vida delas. Então precisamos ser o mais compreensíveis possível em um momento como esse, quando nós mesmos vivenciamos também esses problemas."


Além dos alunos, que precisaram se adaptar às aulas on-line, houve os professores, que transformaram suas casas em salas de aula. Você que é professor sabe como deve ser difícil essa adaptação. Como você acha que os mestres têm lidado com esse desafio?


"Para o professor, o desafio é tão grande quanto para o aluno. Muitos professores não são tecnológicos; dependendo do perfil, são um ‘zero tecnológico’, e tiveram de se adaptar. Eles tiveram de aprender a dar aula por vídeo. A preocupação inicial foi muito grande. Chegamos a dar quatro treinamentos antes do professor dar a aula Ao Vivo. As videoaulas já existiam, embora muito focadas para o vestibular, e não para o colégio como um todo. Mas na prática aconteceu tudo melhor do que o esperado. Em uma semana de videoaula, já tivemos feedback fantástico dos alunos e professores e, até começou a rolar uma preferência de interação ao vivo com o professor. Os professores se adaptaram, mas alguns ainda estão no processo. O lado bom é que as pessoas estão mais compreensivas — todo mundo esperava pouco de uma aula a distância, e hoje, é bem melhor do que o previsto. Jamais vai substituir uma aula presencial no ponto de vista de qualidade, mas há outras vantagens que, quando bem trabalhadas, podem gerar um resultado positivo."


Você acha que a educação on-line vai se tornar uma tendência no futuro das escolas, assim como já é feito nas faculdades?


"É uma resposta difícil. Existe uma diferença muito clara de regulamentação. O Ensino Superior possui uma regulamentação para educação a distância e a Educação Básica não. Foi concedida em termos emergenciais essa flexibilização. Tanto a Secretaria Estadual de Educação quanto o Ministério da Educação legitimaram a gente estar ensinado a distância a contar na carga horária do ano de 2020 em função do Covid-19. Essa regulamentação vai ser estendida depois como período fora disso? A gente não sabe se vai ser aprovado ou não. É indeterminado. Em relação a ter um complemento a distância, acredito que estamos diante de uma grande oportunidade de mudar o paradigma de como as escolas trabalham. As escolas atuam da mesma forma desde sempre. Elas não mudaram a maneira de ensinar seus alunos. Talvez estejamos diante da maior oportunidade de mudar a forma como a gente ensina, para algo mais adaptável e personalizado, oportunidade que a internet nos dá e que não existe no presencial. No presencial, por mais que a gente se esforce, o professor fala para um grupo muito grande."


Como o Intell está se preparando para o futuro pós pandemia?


"A gente iniciou esse projeto em 2018, implementamos algumas funcionalidades em 2019 e vínhamos ampliando as funcionalidades em 2020. É o Intell Digital, que consiste em ferramentas que você consegue utilizar de forma a complementar a educação presencial. É tudo muito novo, então não há tanto estudo na área, já que é muito mais focado em Ensino Superior. E o grande desafio é que a gente não resolve a educação não-presencial. A educação não-presencial não é o mesmo que a Aula ao Vivo via Hangout. É um conjunto de aspectos que geram autonomia para o aluno desde que a gente trabalhe alguns conceitos como sala de aula de invertida, em que o aluno aprende primeiro para depois vir para a aula. A gente vinha se preparando para isso e ganhamos um empurrãozinho — o que estava no planejamento num ritmo de 10 km/h passou para 120 km/h. Na volta do isolamento, é óbvio que vamos viver um momento em que ninguém vai querer ouvir falar em videoaula, mas continuaremos com esse projeto, vamos provavelmente deixá-lo em outro patamar. Estamos aproveitando esse período para construir a base pedagógica e depois adaptar para a volta, até porque a volta não tende a ser rápida e sim gradual. Na verdade, dentro do Intell não tem volta, o Intell Digital veio para ficar."


Na sua opinião, qual legado esta crise deixa para a educação?


"O principal legado talvez seja um olhar diferente em relação ao professor. A sociedade sempre teve um olhar carinhoso para o professor, mas nunca foi um olhar empático, sempre foi um olhar simpático. A gente simpatiza com o professor, mas tem dificuldade de se colocar no lugar dele.E ele acaba sendo um profissional que não conquistou o seu devido valor dentro da nossa sociedade. A pandemia fez com que todo mundo pudesse vivenciar o que é o dia a dia de um professor. Começamos a ter um contato maior de como é a realidade de um professor. A empatia acabou sendo necessária, porque você está vivendo na pele o que o professor vive diariamente e que faz com o maior prazer. Talvez o maior legado da pandemia seja gerar pelo menos a reflexão: a mudança de paradigma de como a sociedade enxerga os profissionais de educação. Se vai mudar ou não, não consigo afirmar. Mas que está todo mundo vivendo isso, isso é um fato. Os profissionais de educação vão estar sempre aqui para tentar fazer o melhor possível. Costumo sempre falar que sair de casa para transformar vida é a construção de um legado incrível, sem querer desmerecer as outras profissões. Eu acho que a gente vai conseguir, independentemente da pandemia; é algo que sempre esteve no nosso DNA. Espero que o legado principal seja a maneira como a sociedade enxerga esse trabalho."


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